domingo, março 06, 2005

O vice solta o verbo



Nenhuma democracia que se preze pode prescindir do confronto de idéias. O debate é um tônico que revigora as instituições.
A mídia, impressa principalmente, é o ringue ideal destes embates retóricos. Nas páginas dos periódicos as palavras amplificam-se em contundência. Situação e oposição lançam-se numa bestial troca de farpas. Antigos aliados escancaram suas diferenças.
O poder implode. O establishment esmorece. A soberania popular agradece.
Leitores deste novíssimo mas já prestigiado Correio, este palavrório pretensamente épico introduz nossa pequena província de belos crepúsculos em uma polêmica que vai chacoalhar o meio político.
Meia dúzia de incautos que acompanham esta coluna sabem que o alcaide Laércio Teixeirinha fez uso deste espaço, semanas atrás, para precipitar-se numa aventura de desmedidas ambições. Quer o atual prefeito mudar a Constituição pra que ele possa tentar o terceiro mandato consecutivo.
Com um latente azedume, o vice-prefeito Plínio Sinete reage ao propósito do (ex?) colega. Este pedaço de página orgulha-se em ser palco do cotejo entre os poderosos da cidade e publica mensagem eivada de fel do “number two”. A ela, ora pois:

“Imprudente colunista, ainda inebriado de estupefação tento serenar meus pensamentos para comentar a cascata de insanidades proferidas pelo prefeito nesta sua coluna. Se é que podemos chamar de coluna esta tribuna difusora da discórdia.
O prefeito Laércio atribui o seu esdrúxulo projeto de re-reeleição a um desejo incontido das bases. Lorota deslavada. Nossos correligionários, salvo um minúsculo séqüito de aduladores, querem ver sinetes badalando na eleição de 2004. Ele disse que vai buscar a tríplice coroa. Ora, tríplice coroa é palavreado de turfe, mas já que ele quer brincar com este jargão de corrida de cavalo, vamos lá: pangarés presunçosos não são concorrentes pra Mangalargas puro-sangue. Dentro do partido o páreo vai ser uma barbada pró-Sinete com mais de dois corpos de vantagem.
Saindo da cocheira mas não dos coices, refuto o pedante sonho de verão do Laércio de emendar a Carta Magna da República. Corre à miúda que ele não consegue nem proibir cachorros no condomínio onde mora.
Laércio desdenha dos colegas de partido chamando-nos de raquíticos e arrogando-se como um garotão sarado, forjado a leite Ninho e mingau de aveia. Não queria apequenar o debate com estas picuinhas nutricionais, mas não posso me furtar de explicitar aos leitores o resultado exuberante de anos e anos ingerindo a encorpada gemada da vovó. Exuberância esta que o espelho me revela todos os dias.
Concluo esta missiva, dizendo-me consciente do relevante papel institucional do vice-prefeito. Esta consciência, porém, jamais poderia ficar submissa a planos de exagerada aspiração eleitoreira. Silenciar seria concordar.
Que as badaladas do Sinete façam ecoar a melodia do bom senso por toda a cidade. Até 2004.”

p.s. Reza a lenda que certas figuras políticas não distinguem o real do ficcional. Diz a mesma lenda que esta miopia dos homens públicos os leva a pedir as cabeças de cronistas mais atrevidos. Que os sinos badalem vigorosamente por liberdade de expressão e sufoquem qualquer estranho ruído de censura.