sábado, março 05, 2005

Meninas do primário

Leio na grande mídia as notícias da sucessão presidencial. Ciro e Serra trocam cada vez mais farpas. É o duelo do malcriado contra o mal-humorado.
Lula incorporou de vez o “Lulinha Paz e Amor” criado pelo marqueteiro Duda Mendonça. Embalado pelo terno Armani ele foge de polêmica como o diabo da cruz. Inodoro e sem gosto, ele molda seu discurso de acordo com a platéia.
Garotinho, bem Garotinho não tem nada a perder, travestido de metralhadora giratória ele ataca tudo e todos. É o toque de humor na campanha. Quer atrair o eleitorado com frases e factóides, mas só tem conseguido provocar risos. O que, diga-se, não é de todo mal nesta campanha coalhada de chatices e rancores.
Já que os jornais não são fecundos pra esta minha mal e porca escritura, vou revirar a memória e servir aos leitores algo que os cronistas de antanho chamariam de mais apetecível.
Realmente leitores, vocês hão de concordar, Taciana e Renata eram, e talvez ainda sejam, coisas bem mais apetecíveis que esta enfadonha política tapuia. Éramos, eu e as duas, colegas nos bancos escolares naquilo que já foi chamado de ensino primário.
Na longínqüa tenra idade deste que vos escreve, (os escribas de outrora também adoravam este “tenra idade”) daquele final dos anos 70, minhas infantes paixões eram por estas duas moçoilas do velho e bom “Joaquim José”.
Paixão por duas?? Sim, é verdade, uma bigamia ingênua. Ingênua, tímida e platônica. Taciana e Renata nunca souberam de meus sentimentos e devassos pensamentos. Que, a bem da verdade, por ainda não estarmos na adolescência, não eram tão devassos assim.
Taciana era magrinha, tipo mignon, seus braços tinham muitos pêlos, seu rosto era de uma morna normalidade, nem bonita nem feia. Bonitinha, digamos. Inteligente ela era, isso sim. Muito inteligente. Tenho certeza de que gostei dela, mas tenho certeza nenhuma em saber o porquê do gostar. Enigmas do coração!
Na 3ª série, dona Mariinha, avó da Taciana, foi nossa professora. Recordo-me que, pra não levantar parentescas suspeições na classe, as provas da menina eram aplicadas pela dona Carmen Balestrin, a professora do outro terceiro ano. Ela ia bem do mesmo jeito, era “A” atrás de “A”.
Numa manhã, minha vó Fiuca me despertou dizendo que a Taciana estava na porta, me chamando. O coração acelerou, a boca secou e as pernas bambearam. Iria ela se declarar pra mim!? Amargo engano. Ela só foi passar o recado que haveria “amigo secreto” entre os alunos do catecismo. Sim, também éramos colegas de catecismo.
E a Renata? Ah, a Renata. Mulherão, ou melhor, meninona.
Morena, cabelos lisos, alta pra caramba, voz grave, ancas fartas e um rosto marcante. Bonito, sim, bem bonito. Mas, mais marcante do que bonito. Até o nome era imponente, destes de encher a boca pra falar: Renata Von Gossler.
Também era inteligente. Uma inteligência blasè, relaxada, que não era “cdf” nem demandava muito estudo. Sabia porque sabia, e pronto.
Renata era irmã gêmea da Roberta. Gêmeas diferentes que a genética chama de bivitelinas. Roberta não era feia, ao contrário. Mas sua beleza estava a léguas da irmã morena. Sim, Roberta era loira. Abismo, mesmo, entre as duas, era o intelectual. Os neurônios fartos na musa morena eram parcos na mana loira.
Com a Taciana eu ainda trocava umas poucas palavras. Com a Renata, não. Tinha medo. Era destas grandes e bonitas que intimidam os homens. Um mito.
Nesta pequena província, por incrível que pareça, nunca mais as vi. Ao que consta, estão casadas e, talvez, com uma penca de filhos.
Filhos estes que não mais devem estudar no “Joaquim José”. Uma escola pública decadente que não é nem mais sombra da excelência em ensino que foi há mais de vinte anos atrás.

1 Comments:

At 2:38 PM, Anonymous Anônimo said...

Lauro Borges Filho!

Gostei do seu texto! Achei-o muito interessante e com algum traço machadiano na descrição do biotipo feminino. Curiosamente fui apaixonado pela irmã da musa bivitelina, Roberta von Gossler. Foi no antigo colegial, no Instituto. Então esta reminiscência tem, em alguma medida, uma certa relação com a expressão machadiana: "o menino é o pai do homem" no sentido de que os nossos anseios, amores platônicos, etc. vão moldar a maneira do nosso ser quando da idade adulta.
Abraços,
Rivaldo moderninho

 

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