sábado, março 05, 2005

Nerso da Sanjinha

Nerso da Sanjinha, definitivamente, é um homem público de hábitos simples.
Este colunista, cioso do compromisso de bem informar seus milhões de leitores, conseguiu agendar uma entrevista com o prefeito recém-eleito pra que ele avaliasse os primeiros trinta dias prefeitando nesta Sanja crepuscular.
Conferi sua simplicidade logo ao adentrar o gabinete para o bate-papo:
—Senta aí, querido... não repara na bagunça que pra cortar gastos eu dispensei a faxineira... eu mesmo tento dar uma ordem, mas como não tenho tempo, já viu, né... (elevando o tom de voz) meu Deus do céu, quequéisso?!... Kaju, vem logo aqui, Kaju, que troço afrescalhado é esse, Kaju? Pedi pro Johnny Marcel preparar um café pra receber o cronista e ele me manda essa bandeja cheia de prataria com esse monte de frutas, frios, geléias, o escambau... tira essa frescurada toda daqui, só quero café preto e bolo de fubá.
Kaju, diligente, fez as vontades prosaicas do chefe Nerso da Sanjinha.
—Prefeito, o senhor assumiu e adotou uma série de medidas austeras. Uma delas foi cortar o celular dos diretores municipais. Medidas como estas têm um caráter simbólico, mas na verdade são um contra-senso porque economizam muito pouco e excluem o primeiro escalão do governo de uma comunicação ágil. E essa comunicação instantânea é imprescindível em qualquer administração, pública ou privada. Estou errado?
—Primeiro: você tá errado, sim. Segundo: há alguns anos atrás ninguém tinha celular e a máquina funcionava sem depender destes brinquedinhos inoportunos... acho uma bobajada ficar invocando modernidades pra onerar as burras do erário. Terceiro: em nome de um suposto progresso tecnológico comete-se muita besteira. Um exemplo: lá nos idos de 1980 a Volkswagen tirou a Variant de linha porque julgavam ser um carro ultrapassado. Burrice. Até hoje não inventaram um carro com aquele porta-malas e que se enfia em qualquer estrada de roça. E, quarto: pedi ao Johnny Marcel que pesquise uma alternativa mais barata de comunicação. Pombo-correio, sinal de fumaça, código morse, sei lá...
—E computadores, prefeito, poderão ser usados?
—Sua pergunta vem eivada de malícia e galhofa. Nem vou responder. Só digo que esse mundinho ‘Uindios’ do Bill Gates tirou muito de poesia da vida. Quer coisa mais gostosa do que o som das teclas de uma velha Remington?! (faz um sonoro tec-tec-tec nostálgico).
—E na área da cultura, prefeito, algum projeto?
—O Johnny Marcel, sabe-se lá porque, quer incluir a Chattanooga no calendário oficial de festas da cidade. A idéia não me empolga. São João é terra de macho pra ficar aclamando aquela vozinha em falsete dos Bee Gees e aquele rebolado indecente do John Travolta. O que eu quero mesmo é que São João seja sede do Festival Nacional de Dança Matuta. Se a idéia vingar, eu e o Kaju vamos formar um grupo de catira. Pra arrebentar!
—Algo mais, prefeito? —Não, nada. Vai com Deus e pela sombra. E manda um beijão pra Ana, pra Josi e pro Laurinho.