O conselheiro
Gregório é um bancário de Porto Alegre com vinte e tantos anos de serviço. Há anos ele poupa uns bagarotes pra realizar o sonho do filho: viajar ao principado de mister Bush para recrear no parquinho de Walt Disney.
Mister Bush é um texano durão. Só abre a porteira do seu principado para turistas terceiro-mundistas que tenham visto diplomático. O turista, para conseguir o carimbo no passaporte, precisa rogar pessoalmente a um burocrata do serviço consular norte-americano.
Uns mil quilômetros de asfalto separam Porto Alegre do consulado ianque mais próximo: São Paulo. Esta viagem toma tempo e dinheiro de Gregório. Dinheiro que Gregório poderia usar para engordar a bagagem de volta com mimos e penduricalhos do Mickey Mouse. Gregório calcula despender uns dois mil reais, entre passagens e estadia, para que ele, a mulher e o filho recebam as bênçãos do almofadinha consular de plantão.
Corre à miúda que mister Bush troca confidências com um bovino do seu rebanho e que este, entre mugidos e porções de feno, aconselhou o patrão a endurecer ainda mais com os fãs do ratinho Mickey.
Seguindo religiosamente os conselhos do seu bovídeo, mister Bush ordenou ao serviço de imigração que identifique digitalmente e fotografe todo proletário que se arvorar a deixar uns trocos nos seus domínios. Mister Bush é ganancioso, além da gaita turística ele quer a marca do dedão e o retrato da plebe rude.
O gaúcho Gregório tem um compatriota mato-grossense que quer mostrar a mister Bush que temos mais que bananas nestes trópicos.
O magistrado federal Julier Sebastião da Silva, invocando o princípio jurídico da reciprocidade, mandou que os súditos de mister Bush tenham igual tratamento ao entrar em território brasileiro. Igual é modo de dizer, enquanto o serviço deles é rico, rápido, eletrônico e asséptico, o nosso é pobre, moroso, manual e lambuzado. Paciência, o gaúcho Gregório diria: cada bagual se vira com a potra que tem.
Enquanto presidentes se aconselham com quadrúpedes e magistrados lavam a alma dos humilhados, nosso turista dos pampas faz galhofa com os hábitos americanos: —Bah, tchê, vou porque o guri insiste, mas esta coisa de churrasquear com hambúrguer e salsicha é coisa de pelotense enrustido.
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